Entrevista Portal Polo Editora

Entrevista publicada no Portal Polo Editora com Marlene Fortuna e Ivo Bilski Donayre

Uma Vida Dedicada às Artes Cênicas

Na entrada do teatro, com seu brilho clássico e atmosfera encantadora, Ivo Donayre se prepara para uma noite especial. Como entrevistador do Portal da Polo – um site dedicado à publicação de artigos e entrevistas que promovem a cultura – ele está ali para conhecer de perto a trajetória de Marlene Fortuna, atriz e acadêmica cuja presença inspira respeito e admiração. Ao avistar Marlene, que exala elegância e carisma, ele a acompanha até uma sala discreta, quase mágica, nos bastidores do teatro. Entre ecos de encenações e memórias das artes cênicas, inicia-se uma conversa envolvente sobre sua vida e obra, com o teatro como silencioso observador.

Ivo Donayre: Marlene, é uma honra tê-la aqui conosco. Você tem uma carreira tão vasta e rica, com contribuições inestimáveis ao teatro e à pesquisa acadêmica. Como se deu sua entrada no mundo das artes?

Marlene Fortuna: Desde muito cedo, o mundo do circo foi minha primeira escola de atuação. Cresci no ambiente do teatro, especialmente com a Companhia Teatral Maracanã, que foi criada e dirigida por meu pai, José Fortuna. Com essa Companhia, percorremos várias capitais brasileiras e até algumas cidades na América Latina. Foi uma época de formação intensa, e o palco se tornou o meu lar.

Ivo Donayre: Seu trabalho no teatro abrange tanto a prática quanto a pesquisa. Você poderia falar um pouco sobre sua trajetória acadêmica?

Marlene Fortuna: Claro. Dediquei-me ao estudo das artes cênicas e da comunicação, e essa busca me levou ao Pós-Doutorado em Artes Cênicas pela UNICAMP, além de um Mestrado e um Doutorado em Comunicação e Semiótica pela PUC/SP. Além disso, sou especialista em teatro, dramaturgia e crítica da imagem. Essas áreas se entrelaçam, pois sempre busquei entender a fundo a essência da arte, sua criação e a expressão vocal. Atualmente, participo do Conselho de Assessores Científicos do MackPesquisa, vinculado à Universidade Presbiteriana Mackenzie, e da UNESP. A pesquisa sempre foi uma extensão da minha prática artística.

Ivo Donayre: Esse olhar crítico e acadêmico é evidente em sua atuação e em seus projetos de pesquisa. Quais são alguns dos núcleos de pesquisa dos quais você fez parte?

Marlene Fortuna: Ao longo dos anos, tive a honra de fundar, coordenar e participar de centros de pesquisa como o Centro de Estudos de Crítica Genética (CECG) na PUC/SP e a Sociedade Científica de Estudos da Arte (CESA) na USP.  Além disso, colaborei com a Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação (INTERCOM) e com o Núcleo de Estudos e Pesquisa da Imagem na Faculdade Cásper Líbero, entre outros. Cada um desses espaços foi essencial para explorar as complexidades da imagem, da expressão vocal e da criação artística.

Ivo Donayre: Você tem uma experiência profunda com a voz profissional. Como se desenvolveu seu trabalho nesse campo?

Marlene Fortuna: A voz é uma das principais ferramentas dos profissionais que dela precisam e desenvolvi um trabalho intenso para compreender seu potencial. Ensinando voz artística e profissional, ajudo as pessoas a se expressarem com qualidade e desinibição. Essa especialização inclui aulas, palestras, oficinas e workshops sobre o uso da voz como instrumento de comunicação. No teatro, é essencial que a voz seja poderosa, mas também flexível o suficiente para se adaptar às demandas emocionais e físicas dos personagens.

Ivo Donayre: Sua trajetória inclui uma vasta experiência como atriz em companhias teatrais renomadas. Como foi sua passagem pelo Grupo de Teatro Macunaíma e pelo CPT sob a direção de Antunes Filho?

Marlene Fortuna: Foi um momento marcante da minha carreira. Com o Grupo de Teatro Macunaíma, que hoje é o Centro de Pesquisa Teatral (CPT) do SESC Consolação, participei de produções icônicas sob a direção de Antunes Filho. Com esse grupo, viajei para diversos festivais internacionais e tive o privilégio de atuar em espetáculos como Macunaíma, Nelson Rodrigues – o eterno retorno, Romeu e Julieta, e A hora e vez de Augusto Matraga. Essas viagens nos levaram para a Europa, América do Norte, Ásia e Oriente Médio, e foram fundamentais para o reconhecimento internacional do teatro brasileiro.

Ivo Donayre: Além da atuação, você tambémtem uma vasta experiência como diretora de interpretação e preparadora vocal. Conte-nos mais sobre essa faceta do seu trabalho.

Marlene Fortuna: Como diretora de interpretação e preparadora vocal, trabalhei com diversas companhias teatrais, orientando o elenco e moldando a performance dos atores. Dirigi atores de peças como Prometeu Acorrentado de Ésquilo, As Troianas de Sófocles, e diversas obras de Nelson Rodrigues. Preparar o elenco para que suas vozes e emoções se conectem ao texto de forma autêntica é um processo fascinante e gratificante.

Ivo Donayre: Com sua ampla experiência no teatro e na academia, você é frequentemente chamada para compor bancas e comissões em concursos públicos. Qual é o seu papel nesses processos?

Marlene Fortuna: Faço parte de bancas de Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), dissertações de mestrado e teses de doutorado. Minha função como avaliadora e arguente é contribuir com uma análise crítica e inspirar o desenvolvimento das pesquisas. Em concursos públicos, participo da seleção de professores especializados, avaliando competências na interpretação teatral e no uso da voz emocional, essenciais para formar futuros atores e diretores.

Ivo Donayre: Marlene, você é uma referência para muitos. Como é ver seu nome incluído na Enciclopédia do Teatro Brasileiro Contemporâneo e em obras sobre a história do teatro no Brasil?

Marlene Fortuna: É gratificante ver meu trabalho reconhecido ao lado de grandes mestres. Estar presente na Enciclopédia do Teatro  Brasileiro Contemporâneo e em livros como Teatro Brasileiro – Um Panorama do Séc. XX de Clóvis Levy é um grande privilégio. Minha foto na capa e contracapa desses livros são um símbolo da minha dedicação a essa arte e um reflexo de toda a história que construímos no teatro brasileiro.

Ivo Donayre: Por fim, como você enxerga o papel do artista no processo de criação e o impacto disso em quem aprecia a obra de arte?

Marlene Fortuna: O processo criativo é uma jornada de enfrentamento e autodescoberta. Minha pesquisa e prática sempre buscaram entender o que acontece com o artista durante a criação. As rasuras, crises, abandonos e dúvidas são elementos que fazem parte desse percurso. Meu objetivo é ajudar o público a ver além da superfície, a entender a arte a partir da profundidade emocional, psicológica e intelectual do artista. Ensinar o público a “ler” essa complexidade transforma a experiência artística em algo mais significativo.

Ivo Donayre: Marlene, foi um prazer conversar com você. Agradecemos por compartilhar suas experiências e sua visão profunda sobre o teatro e a criação artística.

Marlene Fortuna: Agradeço pela oportunidade de compartilhar um pouco da minha trajetória. A arte tem um poder transformador, e espero que ela continue a inspirar gerações futuras.

Ao término da entrevista, Ivo Donayre sentia-se profundamente tocado. As palavras de Marlene Fortuna haviam revelado uma vida intensa, marcada por desafios e conquistas no mundo das artes cênicas.

Em silêncio, ele absorvia o impacto daquela conversa, percebendo na atriz uma força serena que apenas os grandes mestres carregam.

“Obrigado, Marlene. Esta conversa foi uma honra e um aprendizado. Seu amor pelo teatro é inspirador.”

Ela sorriu com gratidão, expressando em cada gesto a generosidade de quem vive para a arte. Ao se despedirem, Ivo deixou o teatro com uma sensação de plenitude, carregando consigo a magia daquele encontro com Marlene Fortuna.